Longa de estreia da roteirista e diretora argelina Kamir Aïnouz, irmã do cineasta cearense Karim Aïnouz. Ela, assim como o irmão, recorre à herança familiar para contar suas histórias. É assim em Charuto de Mel, de 2020, onde Kamir nos leva a meados dos anos 1990 e nos apresenta Selma (Zoé Adjani), uma jovem de 17 anos, filha de uma família burguesa de origem berbere. Até entrar na faculdade ela vivia em uma bolha completamente alheia ao mundo exterior. Aquele choque de realidade e, em especial, a aproximação com Julien (Louis Peres), faz com que Selma percebe o peso das seculares regras que ela precisa seguir. Temos aqui um típico ritual de passagem. Há um contexto político-religioso como pano de fundo, mas o foco maior se faz presente na trajetória de Selma e sua relação com seus pais, especialmente, com sua mãe (Amira Casar). Afinal, trata-se de uma história centrada em dramas femininos contata por uma mulher. É visível o olhar diferenciado e sensível ao abordar certas questões que não receberiam o mesmo tratamento caso fossem mostradas por homens. Ou pelo menos, por boa parte deles. Afinal, existem exceções. E quem conhece a filmografia de Karim sabe que ele faz parte desse seleto grupo de cineastas possuidor de um olhar, digamos assim, mais feminino. Charuto de Mel é um ótimo cartão de visita de uma diretora em busca de uma voz interior que, assim como sua protagonista, se vê dividida entre dois mundos. As escolhas tomadas por Kamir na condução do filme e por Selma no desenrolar de sua trajetória passam sinceridade. E isso é sempre algo bastante positivo. Seja na arte ou na vida. Em tempo: Zoé Adjani é sobrinha da atriz francesa Isabelle Adjani.
CHARUTO DE MEL (Cigare au Miel – França/Argélia/Bélgica 2020). Direção: Kamir Aïnouz. Elenco: Zoé Adjani, Amira Casar, Lyès Salem, Louis Peres, Idir Chender, Axel Granberger, Jud Bengana e Rym Takoucht. Duração: 100 minutos. Distribuição: Reserva Imovision.