Sem exagero algum, o filme A Cruz dos Anos, que o cineasta norte-americano Leo McCarey dirigiu em 1937, poderia ter sido dirigido por Yasujiro Ozu. Não por acaso ele inspirou Era Uma Vez em Tóquio, de 1953, uma das obras-primas mais conhecidas do famoso diretor japonês de dramas familiares intimistas. O roteiro de Viña Delmar teve tripla origem: um romance de Josephine Lawrence, uma peça de Helen e Nolan Leary e um poema de Leo Robin. Acompanhamos aqui a trajetória do casal Barkley (Victor Moore) e Lucy Cooper (Beulah Bondi). Casados há 50 anos, no momento enfrentam uma difícil situação financeira após perderem a casa onde moravam. Isso faz com que fiquem à mercê das filhas e filhos que tiveram. Cinco no total. Porém, nenhum aceita ficar com ambos, o que faz que Bark e Lucy passem a viver separados. O drama se concentra, portanto, na derradeira fase de uma vida que precisa de conforto, atenção e carinho, não encontrando isso onde deveria. Me lembro do livro da amiga Marleth Silva, Quem Vai Cuidar dos Nossos Pais?, que trata desse tema. Esse inesperado e nada agradável processo de separação forçada dos Cooper traz consigo a perda da autoestima e da dignidade de duas pessoas que dedicaram suas vidas às crias que agora, na faixa dos 40 anos, não têm tempo em suas agendas para retribuir o amor que receberam. McCarey decidiu realizar esse trabalho após a morte de seu pai e conduz sua narrativa com sensibilidade e delicadeza. O que torna quase impossível não nos emocionarmos. Isso fez Orson Welles dizer que “até uma pedra choraria”. Em tempo: A Cruz dos Anos, além de Welles, era um dos filmes favoritos de Frank Capra, Jean Renoir, John Ford e George Bernard Shaw. E isso não pouco.
A CRUZ DOS ANOS (Make Way for Tomorrow – EUA 1937). Direção: Leo McCarey. Elenco: Victor Moore, Beulah Bondi, Fay Bainter, Thomas Mitchell, Porter Hall, Barbara Read, Maurice Moscovitch e Elisabeth Risdon. Duração: 91 minutos. Distribuição: Paramount/Criterion.
