Viagens no tempo são impossíveis. Mas às vezes elas acontecem. Quando tinha 15 anos de idade a cineasta e artista visual paulista Fernanda Pessoa realizou o sonho de estudar nos Estados Unidos como intercambista no estado do Arizona, mais precisamente em Mesa. Exatos 15 anos depois ela retorna àquela cidade e reencontra as pessoas que conheceu e com quem conviveu na adolescência. Este resgate histórico-pessoal é mostrado no documentário Zona Árida, de 2019. Fernanda esteve lá em dois momentos marcantes da história recente norte-americana. Na primeira vez, ela estava presente quando do atentado terrorista de 11 de setembro de 2001. Na segunda vez, cerca de dois meses antes da eleição de Donald Trump para a presidência do país, em novembro de 2016. Só que nesse retorno ela não era mais aquela menina sorridente e ingênua e sim uma cineasta séria, questionadora e com uma visão de mundo bem distinta, além de já ter um outro longa-metragem no currículo, Histórias Que Nosso Cinema (Não) Contava, lançado em 2017. Fernanda constata as mudanças ocorridas entre 2016 e 2001. E isso vale para o que havia de bom e, especialmente, para o que havia de ruim. Uma constatação chama a atenção. Mesa é considerada agora a cidade mais conservadora dos Estados Unidos. E tem muito orgulho disso. Apesar da visão equivocada que alguns de seus moradores têm do que é ser conversador. A voz de Fernanda nos conduz pelas lembranças de seu passado e confronta essas lembranças e fotos dela jovem com a Fernanda do presente. Trata-se de uma abordagem bastante corajosa, já que a diretora se mostra por inteiro ao dividir conosco um período transformador de sua vida. A América que ela conheceu e agora visita outra vez revela-se um exemplo perfeito da frase que abre o filme, escrita pelo sociólogo e filósofo francês Jean Baudrillard, em 1986, ano em que, coincidentemente, Fernanda nasceu: “O que é preciso é entrar na ficção da América, na América como ficção. É nessa condição que ela domina o mundo”. No final fica evidente que ela evoluiu. Mas o mesmo não pode ser dito daquele país que um dia fez parte de seus sonhos.
ZONA ÁRIDA (Brasil 2019). Direção: Fernanda Pessoa. Documentário. Duração: 76 minutos. Distribuição: Olhar Distribuição.