Parafraseando a introdução de Um Conto de Duas Cidades, de Charles Dickens, a carreira do cineasta Orson Welles experimentou “o melhor dos tempos e o pior dos tempos”. Depois de Cidadão Kane, o primeiro e único “melhor tempo” que teve, todos os demais foram “piores”. Não em qualidade, que fique bem claro. Welles sempre foi um diretor-roteirista-ator talentosíssimo. No entanto, nunca mais conseguiu as mesmas condições de trabalho conquistadas em sua obra inicial. A Dama de Shanghai, seu quinto filme, que ele dirigiu em 1947, só foi produzido por causa da atriz principal, a estonteante Rita Hayworth, com quem era casado na época. Com roteiro escrito por ele, a partir do romance If I Die Before I Wake, de Sherwood King, a trama é um típico noir. Está tudo lá: uma mulher fatal, um homem de moral dúbia, envolvidos em uma história de crimes, mistérios e reviravoltas. Michael O’Hara (Welles) é um marinheiro que salva Elsa Bannister (Hayworth) de um assalto. Pouco depois, ele é procurado pelo marido dela, Arthur (Everett Sloane), que o contrata para pilotar o iate do casal em uma viagem. Michael, já apaixonado por Elsa, aceita o trabalho e, a partir daí, é melhor não contar mais nada. Welles conduz a história com habilidade e deixa mais uma vez sua marca de gênio. Infelizmente, sofreu muitas pressões do estúdio, que suprimiu quase a metade da duração original do filme (155 minutos foram reduzidos para 87 minutos). Fracasso de público e crítica quando de seu lançamento, A Dama de Shanghai foi reavaliado ao longo das décadas seguintes e hoje é considerado um clássico incontestável.