Existem filmes que possuem o incrível dom de permanecerem atuais. Mesmo que tenham sido feitos meio século atrás. É o caso de Iracema: Uma Transa Amazônica, realizado em 1974 por Jorge Bodanzky e Orlando Senna, a partir de um roteiro dos dois junto com Hermano Penna, o filme foi rodado com câmeras de 16 mm e captação direta de som. O estilo narrativo é cru, documental e direto ao expor a realidade da região à época. Vivíamos o chamado “milagre brasileiro” e a construção de uma rodovia que cortasse a Amazônia traria progresso para aquele pedaço “atrasado” do país. A figura do caminhoneiro Tião Brasil Grande (Paulo Cesar Pereio) é bastante exemplar do desejo de crescimento econômico tão alardeado pela ditadura militar. Tudo começa em Belém do Pará durante a festa do Sírio de Nazaré. É onde Tião conhece Iracema (Edna de Cássia), uma jovem indígena. Ela foi até a capital paraense para pagar uma promessa, porém, certos encontros acabam levando a garota a se prostituir. Neste contexto ela conhece Tião e viaja com ele pela futura “estrada do progresso”. A realidade que vemos ao longo dessa viagem, infelizmente, continua presente nos nossos dias até hoje. Queimadas, prostituição, tráfico de animais, de madeiras e de pessoas, além da flagrante ausência de qualquer infraestrutura. Iracema teve seu lançamento proibido pela censura e por ser uma coprodução com a Alemanha foi exibido em diversos países europeus. No Brasil, a liberação somente ocorreu em 1981. Esta versão que volta agora aos cinemas foi inteiramente restaurada em 4K e devolve ao filme a chance de (re)encontrar seu público e provar mais uma vez a força da arte como retrato de seu tempo. No caso aqui, um tempo que permanece parado.
IRACEMA: UMA TRANSA AMAZÔNICA (Brasil/Alemanha 1974). Direção: Jorge Bodanzky e Orlando Senna. Elenco: Edna de Cássia, Paulo Cesar Pereio, Conceição Senna, Sidnei Pinon, Rose Rodriques e Fernando Neves. Duração: 92 minutos. Distribuição: Gullane Filmes.
