O roteirista, produtor, diretor, ator e montador iraniano Jafar Panahi é um dos mais engajados cineastas de seu país. Sua carreira, que começou em 1988, está repleta de contundente trabalhos. Em julho de 2022 ele foi preso e deveria ficar seis anos encarcerado por “atentar contra o sistema”. A pressão foi intensa e em fevereiro de 2023 ele foi liberado sob fiança. Sem Ursos, seu 12º longa, apesar de ter sido rodado antes da prisão, é um exemplo perfeito da postura desse artista único. O filme nos conta duas histórias simultaneamente: a do próprio diretor e a do filme dentro do filme. Panahi, proibido de sair do Irã, está vivendo em uma aldeia próxima à fronteira com a Turquia. À distância, ele dirige on line uma obra que está sendo rodada no país vizinho. Convém destacar que o cinema de Panahi é construído em camadas que vão sendo reveladas aos poucos. Tudo começa de maneira bem simples, quase banal, e depois, gradativamente, se acumulam até ficarem quase insustentáveis. Sua crítica, sempre contundente, não poupa nada. Das tradições e crenças sem lógica alguma à constante opressão de um estado hipócrita e ultrapassado. A verdade é escancarada sem nenhuma maquiagem. O próprio título resume com perfeição o que verdadeiramente está por trás dessas normas tradicionais. E isso incomoda os detentores do poder e os reacionários de plantão. O olhar crítico e ácido do cineasta não deixa pedra sobre pedra. E “pedra” aqui tem um sentido amplo. Basta observar que a que fica na água usada para o lava-pé é a mesma que serve para uma finalidade completamente diferente.
SEM URSOS (Khers Nist – Irã 2022). Direção: Jafar Panahi. Elenco: Jafar Panahi, Mina Kavani, Naser Hashemi, Vahid Mobasheri, Bakhtiyar Panjeei, Reza Heydari, Narges Delaram e Bülent Keser. Duração: 106 minutos. Distribuição: Imovision.
